sometimes i sit and think. sometimes i just sit.

quinta-feira, 26 de março de 2009

Éditions du Désastre

Acendi um cigarro e resolvi caminhar pela rua. It was about seven o'clock pm, my thoughts were beginning to get foggy, my mind was dark and my intentions mixed with some kind of guilty and contradiction. E enquanto formulava esse texto em minha cabeça, percebia o quão arorgante eu era por pensar em outra língua. 'Enquanto outros nem têm o que comer', eu completava. O que uma coisa tem em comum com outra? Nada, mas quando você tenta justificar o fato de não poder ser arrogante, o principal motivo é esse; enquanto desfrutamos de casa, comida e conhecimento, parece minimamente obsceno esnobar os ignorantes e desfavorecidos falando em outra língua consigo mesmo.
Paulo havia acabado de sair para jantar com Elisa, sob meu conhecimento e passividade mesmo. Decidi que a submissão forma a mulher, e a tentativa de negá-la e subvertê-la é um ato complementar; tentamos provar para nossos homens que somos fortes, mas no fundo sabemos que é apenas parte da encenação fazer surgir um lado que eles não conhecem. Conhecem sim - muito bem. Sempre pareceu-me hipocrisia essa conversa deles, de que não são capazes de nos entender e somos complicadas de compreender. Somos, na verdade, um poço raso - vulneráveis e previsíveis, cheias de facilidades e maneirismos, fantoches de nós mesmas.
Quando Paulo primeiramente disse que havia outra em sua vida, uma lágrima deslizou por meu pescoço até minha blusa. Naquela pequena gota, pareci enxergar o reflexo amargo do que sucederia - refeições em silêncio, banhos exaustivos, noites em claro. Engoli e procurei buscar o lado positivo: o que há demais, então, se ele quer outra? É estupidez esperar que eu baste para alguém. Nunca me considerei o bastante - como esposa, como mãe (não à toa nunca o fui), como filha. Tudo foi extremamente compreensível, senão por um pequeno detalhe que me fazia sofrer e gritar de dor: por que uma mulher mais velha? Sempre entendi que os homens, a partir de uma determinada idade, passam a sentir interesse por mulheres mais jovens. Por autoafirmação, por luxúria, por provação, por hábito. Mas mais velha? Considero meus 45 anos como um número simbólico de maturidade e experiência. Tolerar uma amante, todas toleram. O que se há de mudar? Mas de alguma maneira, aquilo me afetou. O fato de ela ser mais velha. Mais acabada. Mais flácida, enrugada, cansada. Pensei ser apenas uma dificuldade de adaptação, mas não o fora. Tornou-se um martírio sem sentido, e principalmente desnecessário. Alguma atitude eu precisava tomar.
Como não somos previsíveis? Entendíveis somos, ao extremo. Paulo sabe que sou incapaz de fazer qualquer coisa. Paulo sabe que o que mais me mata é o fato de Elisa ser dez anos mais velha que eu. Da minha parte, engulo e aceito, vivo por viver e procuro me distrair como posso. Tereza havia me dito para viajar. Paris, ela disse, seria perfeito. Très bon. Passeie pelos jardins, Montparnasse, vá até Lyon e depois ao saint-etienne.
'Jardins', pensei - eram ao que Paulo me comparava nos primeiros anos de casamento. Comparações que hoje, infelizmente, me parecem cafonas e antiquadas, e que me fazem lembrar do quanto eu sonhava no início.
Relembrando minha juventude matrimonial, acendi o segundo cigarro e resolvi sentar um pouco no parque. Paulo disse-me não saber se voltava hoje, portanto que eu não me preocupasse em deixar comida no forno. Tinha a noite inteira a matar - até a manhã seguinte. Meus planos não eram ambiciosos para esse fim de dia.. muni-me de um maço de cigarros, uma caixa de fósforos e um livro de Virginia Woolf que encontrei numa caixa velha no escritório. Desci do apartamento e caminhei até o parque, após andar sem rumo por algumas ruas arborizadas.
Pensei no suicídio. Clichê demais. Dramático. De repente, enquanto lia o livro, sentada e sozinha naquele frio lugar, percebi de um estalo o quão crescida eu havia me tornado. O quão madura e mulher eu de fato era. Já fui até traída, disse minha voz zombeteira. Dei uma risada e continuei a leitura.

Já fazia um tempo que eu não conseguia controlar meus pensamentos durante a leitura de um livro. Minhas ideias vagavam infinamente, enquanto meus olhos simplesmente corriam da esquerda para a direita de uma linha para outra. Dessa vez, não foi diferente. Olhei para trás, nos tempos muito distantes de escola, em que intrigas de colegas e boatos maldosos eram as principais questões da minha vida. Meu grupo de amigos, um dos mais intelectualizados da época (não era muito difícil de sê-lo, ao meio de tão burras pessoas) consistia num aglomerado de oito, nove pessoas. Os cinismos, falsidades e pequenas polêmicas eram nossas ocupações mais essenciais. Cresci, um dia, e comecei a trabalhar. Os focos eram outros, cinco anos depois. Contas, dívidas e obrigações eram minhas especialidades então.
L'année dernière à faculdade talvez tenha sido o mais doloroso e intenso. Havia passado um bom tempo sonhando em lecionar, quando Paulo entrou em minha vida e meus conceitos tomaram outro rumo. Eu era jovem à época, e sonhava em mudar o mundo. Ele convenceu-me a desfrutar a situação financeira confortável que tinha, sonhar mais alto e mudar meu mundo. Inúmeras discussões ideológicas surgiram entre nós; viver para mudar a sociedade ou me mudar para ser mais feliz e confortável? Optei por uma segunda opção. Hoje, não posso dizer se me arrependo.. desde que Elisa apareceu em minha vida, o passado tornou-se misterioso e indecifrável. Vivo no presente, e sei como será o futuro. Fecho meus olhos e vislumbro o futuro como se ele se limitasse a noites de revezamento na cama: ora com ele, ora sem ele, ora com ele, ora sem ele, ora com ele, ora sem ele...
Mas afinal, lembro que pós-graduei-me em Paris. Por insistência de Paulo.. Meu sonho de dar aulas em escolas públicas fora substiuído pelo de trabalhar com traduções e ensinar literatura no exterior. Très chic, soava minha consciência na época, junto com algo complementar que hoje entendo por ser um vazio latente.
A esperança morreu em mim, assim como morre em todos em algum momento da vida. Hoje, acredito que ela seja um desencargo de consciência, criada para eufemizar um eterno descontentamento humano e infelicidade inevitável, um fim trágico que invariavelmente nos assola.

É claro que se Paulo dissesse eu te amo, desistira dessa baboseira schopenhaueriana.
E agora? Lembro de meus sonhos, meu passado.. foi assustador, décadas atrás, ver minhas ideologias mudando. Parecia tão certa de mim.. Mas esse meu eu parece tão embaçado, agora..

Acendo mais um cigarro e viro a página.








Pour ma mère, Luiza, Antoine & Aurélie, Paris et mon future.